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quarta-feira, 12 de agosto de 2015

ENTREVISTAS - CAROLENA NERICCIO

Carolena Nericcio Criadora do estilo ATS® – American Tribal Style e diretora do grupo FCBD® (FatChanceBellyDance)
Entrevistadora: Rebeca Piñeiro | Tradução : Aline Muhana | Entrevista feita para Revista Shimmie Ampliando Conceitos
1) RP: Carolena, quais foram suas inspirações para estruturar o ATS®? CN: Eu descreveria da seguinte forma: Quando comecei a dar aulas de dança do ventre era apenas isso, aulas de dança do ventre. Eu usava o formato que aprendi de minha professora Masha Archer que eu conhecia apenas como dança do ventre.
Ela é uma artista muito talentosa e a forma como ela utilizava o figurino e a estética geral do seu estilo era muito especifica e eu achava que dança do ventre era isso. Então quando comecei a dar aulas eu não tinha experiência com outros estilos e foi muito natural seguir o formato que ela me ensinou então quando as pessoas começaram a mencionar outros estilos de dança do ventre eu não sabia do que elas estavam falando e também não me importava muito. Me interessei bastante depois mas não naquele primeiro momento.
E eu vivia nessa “bolha” de conhecimento passado por mim por Masha, porque eu achava que o estilo dela era a coisa mais incrível do mundo e era assim que eu gostava de ver as coisas. Mas as pessoas continuavam a trazer mais perguntas à respeito de outros movimentos, outras culturas de outros países e outras formas de dança e aquilo me forçou a sair daquela “bolha” e conhecer outras coisas. E o que eu comecei a perceber foi que em termos de estrutura, o que nos tentávamos fazer era um estilo de improvisação coordenada em que duas, três ou quatro dançarinas se apresentavam juntas e o real propósito disso. Como mencionei anteriormente , no estilo de apresentação improvisado de Masha, a bailarina mais experiente poderia mudar o movimento o movimento do grupo mas ela não necessariamente tinha que estar na frente das outras para fazê-lo, era esperado que você soubesse que iria acontecer e era extremamente confuso.
E eu tenho essa forma organizada de pensar as coisas e aquilo não fazia nenhum sentido para mim (minhas alunas nunca aceitariam tal coisa!) então tivemos que pensar em melhorar isso.
A dançarina mais experiente tinha que ficar na frente das outras para passar a informação para as outras. O que fiz foi observar as alunas em sala de aula e pode notar quando a dançarina sênior mudaria o movimento, por causa da forma que ela mudava de um movimento para o outro.
Muito similar à estrutura da música folclórica egípcia, em que o percussionista usa a medida de 4/4 do ritmo para mudar de frase musical, à partir de uma deixa da última repetição da frase percussiva para avisar aos outros músicos que a frase mudaria. Eu notei que a dançaria sênior fazia o mesmo e dava uma “deixa” que significava: “vou fazer algo diferente” e trazia a atenção para alguma parte do seu corpo que sinalizaria a mudança.
Poderia ser no ângulo dos seus pés ou a forma que movimentavam os braços para cima e/ou para baixo, ou a forma que movimentavam os ombro sinalizado “estou me preparando para girar” e coisas do gênero. Então foram nessas observações em que me baseei para estruturar o estilo, a experiência de improvisação com duas, três ou quatro dançarinas. Qualquer formação com mais pessoas era confuso demais, e com menos pessoas do que isso, seria um solo. Às vezes temos solos mas a maioria das apresentações são em grupos.
Originalmente nós dançávamos apenas em festas então a formação não tinha muito critério de posicionamento, então começamos a nos apresentar em um pequeno café chamado “Café Istambul” em que os espaço para dança era bastante estreito e as dançarinas só podiam ficar em uma posição específica, que era em diagonal , que era possível para duetos e trios.
Essa situação nos levou a trabalhar em diagonais. E então nos vimos em apresentações em parques e festivais e nos demos conta que a formação em triângulo para os trios e em linhas intercaladas para os quartetos era uma boa forma de manter as diagonais e ainda sim ver a dançarina-líder.
Então foi isso (uma longa resposta para sua pergunta curta), eu apenas observava o que estava acontecendo. E em termos de figurino : os adornos de cabeça, as jóias, o choli, as calças bufantes, a saia, o xale , eram bem o que usávamos com Masha. Para ela as cores seriam mais pastéis, mais européias , como uma pintura de Alfonse Mucha , e para mim as cores seriam mais cruas e ousadas, com um visual mais folclórico e alegre.
Eu adicionei meu toque pessoal e a minha inspiração porém mantendo a estrutura básica do figurino, com mudanças das texturas dos tecidos e nas cores, passando dos pastéis e dos tons lavados para algo mais arrojado, natural e vigoroso.
2) RP: Após 25 anos de FCBD®, você sente que ainda precisa procurar novas inspirações para a evolução do estilo ou consideraria seu trabalho encerrado? CN: Encerrado seria um pouco extremo, eu diria terminado. Quando lançamos o DVD 7, na ocasião do aniversário de 20 anos do estilo eu considerei que a minha criação estava completa e fiquei bastante satisfeita. Mas alguns Sister Studios vieram com algumas variações para alguns passos , o que eu achei frustrante por não ver propósito nisto, e até nós mesmas no FCBD surgimos com variações também , então tive que admitir que o estilo continuava a crescer. Num primeiro momento me senti frustrada, como já mencionei, porque só de pensar no trabalho que isso tudo daria já me senti exausta. Percebi que seria inevitável, com a evolução do estilo haveria que se assegurar a liberdade de criação, então eu me rendi à idéia de reunir 3 Sister Studios mais o FCBD® e criamos o volume 9 com um manual para a criação de novos passos se assim for do desejo de quem dança ( e este seria tema para uma outra entrevista completa). Então eu não diria que o conceito está encerrado, eu diria que está completo e diria ainda que continua a se desenvolver, respeitando seu formato original.
3) RP: Porque você começou a dançar em grupo? CN: É uma boa pergunta! Como disse antes, na época em que dancei com Masha Archer haviam solos ocasionalmente, mas ela gostava mais da idéia de dançarinas trabalhando juntas. Em vez da idéia de competição entre dançarinas, coisa ela observou tantas vezes até que ela começasse a dar aulas, que mesmo em grupo tentavam aparecer mais que a outras competindo entre si e tentando provar qual delas era a melhor.
Ela achava essa atitude sem sentido porque quando estamos no campo da Arte não existe este sentido de competição, então ela passava para nós uma mentalidade de cooperação quando dançávamos juntas. Então eu interpretei isso como a forma que deveria ser.
E o que pude perceber da minha experiência inicial lecionando foi que os solos criavam mesmo esta sensação de “quem é a melhor”, coisa que eu não gostava. É como quando você vê uma dançarina cercada por outras e automaticamente você pensa que ela está se destacando porque ela é a melhor do grupo, e não porque ela teria a leitura musical mais interessante para esse pedaço da musica por exemplo. Com o passar do tempo mantivemos o solo, mas ele não faz parte da natureza do estilo como quero apresentá-lo.
Então nos grupos de duetos, trios e quartetos a audiência tende a ficar desconectada das particularidades de cada dançarina (a mais bonita, a mais alta, a mais voluptuosa ou a mais magra… a que tem cabelo roxo… enfim!) e se concentra no todo, como uma verdadeira pintura em movimento.
A primeira coisa que se vê é a totalidade desta “pintura”, e então você nota qual é o tema, e pequenas partes desse todo começam a se destacar. Eu não queria que estas “pequenas partes” se destacassem antes do tema principal, e a atenção não se perde deste tema.
E isso agradou a muitas pessoas porque se você quer dançar mas não quer ser uma solista, você não precisa. Não é necessário lidar com toda aquela pressão de ser o centro das atenções , eu mesma nunca quis ser uma solista. Muitas alunas que freqüentavam as minhas aulas se sentiam desta maneira e isso fez com que elas se sentissem confortáveis e isso ajudou muito.
À medida que o ATS® foi ficando mais popular senti muita pressão por parte das pessoas para fazer solos, por que eles queriam me ver dançando sozinha e eu pensei “mas isso vai contra o propósito da coisa”, mas acabei cedendo porque vi o porquê delas quererem tanto. Então apresento solos ocasionalmente mas não gosto deles tanto quando gosto de dançar em grupo.
4) RP: Como criadora do ATS® como você se sente a respeito da projeção mundial que o estilo vem tomando em todo o mundo? Você algum dia imaginou que o estilo se tornaria tão popular?  CN: Eu tenho três respostas para esta pergunta. Eu esperava que o estilo se tornaria tão popular? Não. Foi minha intenção que ele se tornasse tão popular? Não. O porquê de ter se tornado tão popular faz sentido para mim? Sim. Porque é belo, é de uma beleza universal, é acessível, e eu penso “é claro que todos querem fazê-lo”.
Eu quis que se tornasse o propósito da minha vida então porque outras pessoas não iriam querem também? Foi sem intenção, sem promovê-lo dessa forma que faz com que faça total sentido. O que mais se poderia querer?
5) RP: Quais são seus próximos objetivos? No que você gostaria que o a ATS® se transformasse no futuro? CN: Como disse antes, sinto que o meu objetivo foi atingido e o fundamento está completo e cabe a ele uma evolução , então eu acho que o conceito continuará a se expandir , crescer e se tornar sustentável e saudável. O que eu realmente gostaria de ver seria o ATS® mais presente na mídia.
Eu gostaria de ver a dança do ventre sendo apresentada de uma forma mais séria, e não apenas como um hobby ou uma dança sexy. Seria muito bom se a mídia desse uma chance de retratar a dança como uma forma de arte de grande beleza, independente do que as pessoas consideram como um estilo formal de dança , independente da opinião pessoal de algumas pessoas do que é beleza feminina. Se apenas eles pudessem ver através dessas coisas pequenas o verdadeiro valor da dança eu me daria por satisfeita.
6) RP: Qual a sua opinião sobre a importância do estudo teórico para a dança? Fale sobre. CN: É de extrema importância o conhecimento sobre as raízes das coisas. Acho que as pessoas passam tempo demais em páginas da internet e não dançam o suficiente. O que pude descobrir à partir da minha experiência pessoal e que posso recomendar para os outros: tenha em mente de forma clara a diferença entre o que são informações históricas e factuais do que é arte.
Então, se você está interessada em reproduzir fielmente “a dança dos Beduínos das montanhas Atlas do Marrocos” estude intensamente e faça-o. Mas se você está interessada em criar algo interessante para performance então faça-o, use as influências históricas, modifique se for preciso. Minha opinião é que as pessoas às vezes tentam com muita veemência ser original e ser historicamente fiéis, mas eu não acho que isso seja possível.
Acho que se pode ser um ou outro , mas isso não quer dizer que eu não possa usar influências de um ou de outro, mas se você está reproduzindo algo que já existe e está dizendo que é algo totalmente novo é aí que o problema se estabelece.
As pessoas têm muito medo de se assumir artisticamente então elas copiam algo e fazem pequenas mudanças, mas não de uma forma eficiente para que se torne algo diferente e então temos eventos de dança do ventre cheios de idéias mal desenvolvidas por que as pessoas simplesmente não tem talento nem coragem de assumir riscos.
Simplificando, acho que o estudo é muito importante, pesquisa cultural é muito importante, mas ou se tem uma reprodução fiel do que se quer representar com os estudos ou use aquela influência e faça algo que tenha a sua assinatura. Porque é isso que eu venho testemunhando desde o início da minha carreira, as pessoas pensavam que o que eu estava fazendo com o ATS® no início era mais autêntico do que a dança do ventre (dança do ventre estilo oriental, ou cabaret como os americanos chamam) e não é.
A Dança do ventre sempre foi mais autêntica no sentido histórico que o ATS®, e só porque “parecíamos” mais folclóricos as pessoas assumiram que nós éramos a verdadeira dança, e isso nos causou problemas imensos com a comunidade da dança do ventre. E isso me forçou a tomar uma decisão definitiva sobre esse assunto, o que me rendeu liberdade para perseguir os meus interesses artísticos e estéticos.
É claro que existem ligações entre o meu trabalho e os aspectos tradicionais das culturas que pesquisei, mas eu não tento retratar nenhuma tribo em específico. Eu respeito todas as influências às quais me inspiro a ponto de não tentar reproduzir essas influências sem o conhecimento necessário.
Por que se eu fosse perseguir o conhecimento de centenas de formas de dança então nunca faria o que eu faço, porque seria completamente consumida por essa pesquisa. Então pode ser muito libertador se você cortar o cordão, e também pode ser bastante intimidador se você procura fazer algo novo, mas é necessário seguir a sua inspiração. Na arte não existe “certo ou errado”, existe a coragem de se fazer o que se deseja, e se as pessoas gostarem, ok. Se elas não gostarem não pense que não está “correto” apenas continue tentando, siga a sua inspiração.
7) RP: Sabemos que o ATS® originou o Tribal Fusion. Como você se sentiu quando as primeiras modificações do seu estilo aconteceram? CN: Posso dizer que as primeiras modificações do ATS® não foram fusões, não foram Tribal Fusion. As primeiras modificações vieram de pessoas que freqüentaram as minhas aulas e decidiram que elas mesmas gostariam de lecionar, ou se mudaram , ou estiveram na companhia de dança e decidiram criar o seu próprio grupo em outro lugar…foi inevitável e lamentável porque o meu trabalho ainda não estava completo, as pessoas pegaram informações pela metade.
E quando foram usar o que tinham aprendido tiveram que completar o conhecimento com outras coisas. Então tivemos todas estas variações do ATS® ou da dança tribal. Minha primeira reação foi ficar de coração partido. Foi uma grande confusão, fiquei chocada. Então fiquei desapontada e magoada porque senti que essas pessoas me roubaram de alguma forma e eu não podia acreditar nisso, eu nunca faria tal coisa com a minha professora.
Eu não comecei a dar aulas enquanto ela não se aposentou. Jamais eu daria aula com ela em atividade. Nunca me ocorreu, e se tivesse eu trataria de tirar esse pensamento da minha cabeça. Então, foi assim: as pessoas abrindo aulas na minha esquina e dizendo que o que elas faziam era a mesma coisa que eu, ou chamando por outro nome e oferecendo o mesmo que eu. Era exatamente o que eu disse sobre danças folclórica e expressão artística. Se você vai utilizar a idéia de outra pessoa e modificá-la, faça grandes modificações.
Não faça “mudançazinhas” e diga que é completamente novo, porque não é. À princípio eu quis criticar essas pessoas mas me dei conta que se eu fizesse isso a dança nunca cresceria, então eu simplesmente parei de me importar. E foi a minha salvação, saber quando não se importar.
Por uns bons anos eu não prestei atenção às coisas novas que as pessoas estavam inventando até que o Tribal Fusion apareceu e eu pensei “O que será isso? O que isso tem a ver com o que eu faço? Por que estão chamando isso de Tribal?” E por um bom tempo o tribal de tornou “a lata de lixo” para aqueles que queriam fazer algo diferente e não tinham coragem de de se opor à dança oriental e dizer “eu quero modificar o seu estilo”. Mas como o tribal era algo experimental e se originou da dança oriental era ok modificar o quanto se quisesse.
O termo “tribal” tomou uma conotação totalmente errada e não foi, até que Rachel Brice aparecesse e finalmente houve um entendimento maior e a coisa toda passasse a fazer mais sentido para mim. Ela é uma pessoa muito talentosa e inteligente e disse para mim “eu quero fazer tal coisa que se parecesse dessa forma, do que devo chamá-la?” e eu respondi “eu não sei” então acho que dissemos juntas “então vamos chamá-lo de Tribal Fusion”.
E fiquei muito satisfeita por termos tido esta conversa, ela me pediu a minha opinião e realmente criou algo que vem do ATS® mas é completamente diferente. É como se você pudesse olhar para nós e ver as semelhanças, apesar das diferenças, fizemos um ensaio fotográfico em que trocávamos de figurino e era essa a sensação.
E é muito obvio que existem elementos do ATS® no que ela faz, mas ela não modificou pouco, modificou muito e agora posso ver que o que ela faz é distinto, porém vejo muitas pessoas simplesmente “nadando” entre uma coisa e outra sem entender. Elas não têm essa perspectiva das duas partes e acabam tendo muitas informações desencontradas, ou não são talentosas ou habilidosas o suficiente para criar algo próprio. Então se copia sem se entender, o que desorganiza o cenário todo.
8) RP: Você viajará muito menos em 2013 para escrever o seu livro, conte-nos mais sobre este projeto. CN: Bom, este projeto é algo que vem sendo cobrado de mim por muito tempo. Ao mesmo tempo em que as pessoas me pediram para desenvolver um estilo de dança, e quiseram modificá-lo e me pediram para viajar o mundo ensinando-o. E então disse “eu posso fazer tudo isso ao mesmo tempo”, e por um tempo achei que poderia escrever um livro enquanto fazia tudo o mais, mas ficou muito claro que eu não poderia. Resolvemos tirar o próximo ano para escrever o livro, apesar de ainda ter alguns poucos compromissos, eu e minha companheira de Tribal Pura, Megga Gavin.
Quero que o livro seja sobre a história do ATS®, mas visto sob a minha ótica e minhas experiências para que as pessoas possam entender um pouco mais sobre de onde veio e como foi o processo, como foi o ambiente em que cresci, e o que eu presenciei. O que me inspirou, quais foram as minhas experiências, as minhas influências e como isso tudo foi fundamental para a concepção do ATS® e do Tribal e para que estes sejam melhor entendidos.
Porque muitas vezes as pessoas acham que o ATS® é muito rígido, e não sinto que seja assim. Acho o sistema flexível e a cada vez que se dança é diferente. E a razão da estruturação e das regras do estilo é para que se possa aproveitá-lo. Então não é como se você estivesse tentando construir algo indefinido sem sucesso , é definido porque precisa ser. E isso vem minha da experiência de tentativa e erro, de deixar ficar o que funciona e abrir mão do que não funciona.
9) RP: Deixe uma mensagem para os nossos leitores da Revista Shimmie. CN: Eu diria para você terminar de ler a sua edição da Shimmie, coloque de lado e vá fazer uma aula de ATS®! Pare de pensar e vá dançar. Todas as respostas que você precisa estão na dança. Apenas assista a uma aula do inicio ao fim, mantenha sua mente aberta o tempo todo e não traga pré-conceitos, deixe o seu corpo experimentar e a sua mente vai entender no final, a sua mente não será capaz de explicar ao seu corpo, mas ele vai entender sozinho.

domingo, 9 de agosto de 2015

KAJIRA ENTREVISTA CAROLENA NERICCIO - PARTE 4

"A IGNORÂNCIA É UMA VIRTUDE"

Uma entrevista com Carolena Nericcio, Instrutora e Diretora da FatChanceBellyDance de São Francisco. Entrevista conduzida por Kajira Djoumahna, em 06/01/96. 





No ano passado, em sua entrevista na Revista Whole Earth, tornou-se público que você tem Esclerose Múltipla. Por favor, conte-nos sobre como a doença afetou sua vida. Bem, é diferente a cada dia. Quando eu fui diagnosticada pela primeira vez, tomei a decisão de parar de costurar e começar a dançar em tempo integral porque eu não tinha certeza de quanto tempo seria capaz de dançar. Eu estou contente que eu fiz isso, mas realmente estou ficando cansada. Então agora estou começando a pensar no futuro disso até. É muito cansativo; alguns dias eu não me sinto bem me apresentando ou ensinando, mas sempre me sinto melhor quando faço. No ano passado, eu levei muito tempo afastada, mas comecei a me sentir desconectada e decidi que queria voltar. Eu não posso adotar o mesmo tipo de espetáculos que envolvem direção por horas e demonstração ou apresentação em algum ambiente de feira empoeirado e quente onde você tem que se vestir em um cubículo e há muitas pessoas ao redor. Quando esse tipo de situações aparece, eu sinto que eu queria bater em retirada. Eu também andei  perdendo muito a cabeça. Agora eu sei quando simplesmente ir embora e não descontar nos outros. Eu vivo cada dia como se fosse o último e tenho cuidado para não me sobrecarregar. Os sintomas vêm e vão.

Como você continua em boa forma, apesar de tudo isso? Eu passo pelo menos uma ou duas horas por dia na academia. Venho me exercitando durante dez anos. Sempre levantei pesos e admirava fisiculturistas e a disciplina necessária para eles chegarem onde estão. Com certeza me influenciei por fisiculturistas mulheres. Eu também realmente gosto de ir à academia, não é uma obrigação para mim. Às vezes, o único momento particular que eu tenho é na academia. Minha dieta é muito rigorosa também, evito gordura, sou uma vegetariana e evito pratos elaborados porque embrulha meu estômago. Gosto de comidas simples que são simples e fáceis de digerir. Eu tenho um tipo de transtorno alimentar intenso, e estava realmente feliz por ter me imposto a dieta da MS (Esclerose Múltipla), porque é o que comeria por escolha de qualquer maneira. Mas agora quando as pessoas dizem "oh, você pode comer isso", eu posso dizer "não, eu realmente não posso" e elas me deixarão em paz.

Você tem algum conselho geral para as alunas de dança do ventre? Mantenha-se ereta e sorria! Em geral, sinto que as pessoas poderiam ser mais fortes. Estou desalentada com a quantidade de condicionamento físico (ou falta de condicionamento) que muitas dançarinas mantêm depois de anos de apresentação ou estudo. Não estou dizendo que você tem que ser uma fisiculturista, ou tão magra quanto uma bailarina, mas eu gostaria de ver as mulheres levarem este estilo de dança e a si mesmas mais a sério e se condicionarem com vigor e força. Também menos competitividade, por favor! Há muito espaço para todas. O mundo está interessado em ter um monte de dançarinas do ventre, mas as dançarinas tornam seu mundo mesquinho competindo tanto. Parem com isso, e todas vocês terão trabalho.

E um conselho para as professoras? 
Eu não tentaria dar conselhos a outra profissional. Direi apenas que quanto mais consistentes e generosas nós formos, mais as pessoas pretenderão vir e estudar, ao invés do contrário.

Algum conselho para artistas, sejam profissionais ou aquelas que estão começando? Novamente, eu não preciso dar conselhos às profissionais, mas para novas artistas eu diria: tentem conseguir uma visão panorâmica do que está acontecendo durante a sua apresentação. Tente parar de pensar em si mesma. O público pode perceber o medo. Você tem que ser capaz de se abrir ao público sem se prender a ele ou procurar por aprovação. Olhe-o e envolva-o sem distinção. Aprenda a abrir-se e se expressar. Cometa muitos erros. Esteja disposta a cometer erros e esteja aberta à crítica. Faça um trabalho construtivo com a crítica que você receber. Eu acho que muitas artistas em formação se abalam e ficam tão arrasadas com a crítica que recebem que elas se fecham e param de ouvir às pessoas. É estar fadada ao fracasso! Leve-a para casa e pense sobre isto. Veja o que você pode fazer para melhorar. Cultive a participação da sua professora, pois ninguém pode lhe dar o conselho que sua professora pode. Se você se isola, você pode estar perdendo uma enciclopédia inteira de conhecimento. Chegar ao palco sem o apoio da sua professora é não receber o restante da sua educação.
 
O que você vê como o futuro da dança do ventre na América? É bom ver pessoas tentando coisas novas. Eu acho bom que as pessoas estejam aproveitando o fato de que são Americanas que podem empregar um estilo de dança Árabe e aplicar suas idéias a ele sem sentir como se estivessem sendo inadequadas. Me parece que todos os árabes que entrei em contato estão encantados com o que estamos fazendo com sua dança e não parecem ter qualquer problema com as interpretações Americanas dela. Eu gosto da aproximação de mente aberta. Gostaria de ver a dança ser promovida em uma audiência pública em geral mais convencional. De modo que quanto mais pessoas estiverem expostas a ela, mais pessoas poderão ganhar a vida com ela, e todas as dançarinas que desejam encontrar locais para se apresentar sem o estigma de "coisa de stripper".

Para ler o original, clique AQUI
Uma entrevista com Carolena Nericcio

Tradutora: Suzana Guerra | Revisão: Aline Oliveira | Edição: Ana Harff


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sábado, 8 de agosto de 2015

KAJIRA ENTREVISTA CAROLENA NERICCIO - PARTE 3

"A IGNORÂNCIA É UMA VIRTUDE"

Uma entrevista com Carolena Nericcio, Instrutora e Diretora da FatChanceBellyDance de São Francisco. Entrevista conduzida por Kajira Djoumahna, em 06/01/96. 


Ao longo dos anos seu negócio de venda pelo correio realmente expandiu e decolou. Você pode contar a nossas leitoras um pouco sobre os tipos de coisas que você oferece, e como ele veio a ser o que é hoje?

As coisas oferecidas no catálogo são todas as coisas que você deseja poder encontrar em um lugar quando você começa a dançar pela primeira vez! Música, livros, vídeos instrutivos e documentários, elementos do figurino, etc. Tenho uma forte experiência em desenho de moda e varejo então não tive muito esforço para visualizar o catálogo e colocá-lo em ação. E, como pessoa controladora que sou, eu realmente acredito no poder do esforço coletivo. Então, uma boa parte do catálogo exibe cosméticos fabricados por Suzanne Elliott e peças do figurino por Gwen Heckeroth.

Você pode nos dizer sobre a Second Skin, Lunatique, a Gypsy Caravan com base em Oregon, e qualquer outra trupe de alunas descendente? A Second Skin originou-se porque eu precisava de alguma diferenciação entre o grupo central e as novas dançarinas que chegam, porque as novas garotas precisavam de muito treino de apresentação. Agora, porém, todas elas assimilaram-se na trupe. Eu sei que há um bom número grupos do estilo da FCBD formando-se por todo o país. Estou realmente muito lisonjeada, mas eu gostaria que ligassem pra casa! Estou realmente interessada no que elas estão fazendo, como misturaram meu estilo com os de outras professoras, suas próprias idéias e pesquisa. Mas eu não recebi muitos contatos muita ligação - Eu sei, eu sei, eu sou intimidante! Mas isso é indústria de entretenimento. Eu quero que minhas alunas apresentem-se e evoluam. Apenas gostaria de ser incluída. Eu quero que elas me liguem e façam perguntas. Eu tenho um diálogo corrente com Kendra de La Danse Serpentine e Suzanne de Invaders of the Heart. Elas sempre revisam comigo e me contam sobre seus espetáculos, sucessos e fracassos. Eu desejo esse tipo de interação.

Notei que os membros de sua trupe apresentam-se no estilo da  FCBD exclusivamente. Isto é simplesmente por sua escolha, ou você as incentiva explorar outros estilos, ou expressões solo? Você já disse que você as incentiva estudar Kathak e Flamenco. Quero dizer outros estilos de dança do ventre. São elas, ou você, ou o quê? 
Quanto à exclusividade, as dançarinas são completamente livres para estudar com outras professoras, dança do ventre ou outro estilo. Mas, para dizer a verdade, eu as mantenho bastante ocupadas. Eles parecem realmente apreciar a disciplina e consistência do nosso estilo. O Tribal Americano é em si uma idéia nova, por isso procuro estar com a mente aberta para material novo. O negócio é que nós queremos manter nosso estilo distinto. Então, quando alguém traz algo novo, nós examinamos e aprimoramos para se adequar ao nosso formato.

Você foi uma solista no Festival de Dança Étnica de SF em qual ano? 
Em 1995. Isso não é algo que eu tinha planejado. Elas realmente me incentivaram a fazer uma audição solo. Eu geralmente não deixo as garotas fazerem solos. Tudo bem dançar solo em uma festa de uma amiga, mas em termos de ser contratadas, eu insisto em duas ou mais dançarinas sempre. Então, eu realmente quero que a parte tribal e o companheirismo das mulheres continuem. Então, eu realmente tive que pensar por muito tempo e severamente sobre isso antes que eu decidisse fazê-la. Foi um desafio que eu realmente precisava, mas eu não queria me contradizer. Então eu decidi fazer algo diferente. Eu dancei sem o turbante , e fiz apenas as belly rolls ( ondulações abdominais ) e taxeem (ondulação de quadril), pois essa é minha parte favorita. Eu realmente não me importava se eu entraria ou não. Eu realmente queria que a trupe entrasse, e realmente me decepcionou que elas me escolheram e não minha trupe! Eu estava muito insultada. Mas foi um tipo de limpeza em que elas pegaram algo tão sutil quanto minha apresentação solo. Eu não me movimentei no palco, apenas fiquei lá em pé e fiz belly rolls (ondulaçõesabdominais ) e flutters (vibrações). De modo que só prova que você não tem que estar por todo o lugar para conseguir sua atenção. Foi uma experiência agradável, mas não é algo que eu possa ver baseando toda uma nova carreira!

Eu sei que algumas pessoas gostariam de informações sobre as tatuagens que você e alguns membros da trupe têm. Elas têm algum significado? Não, as tatuagens são uma escolha pessoal. Apenas incidimos em sermos pessoas tatuadas. Há uma piada que diz algo assim: a única diferença entre as pessoas tatuadas e as não tatuadas é que as pessoas tatuadas não ligam! As pessoas não tatuadas continuam nos perguntando o que elas significam, mas elas somente querem dizer que nós temos tatuagens!

Como o figurino da trupe evoluiu? Originalmente, quando eu dançava com Masha, nós vestíamos pantalonas e sem saia, um xale de quadril sem cinturão, e um choli (mini blusa de mangas usada embaixo do sari) com um sutiã. Também um turbante baixo   com um monte de jóias. Quando comecei a ensinar pela primeira vez, eu defendi o uso desse tipo de figurino. Então um dia alguém entrou com uma saia grande e linda da Renaissance Faire (Feira da Renascença). No início eu disse: "Não,nósnão vestimos isto", mas quando coloquei uma que eu percebi que elas eram realmente boas! Assim, em seguida, todas nós tínhamos saias. Em algum momento, o cinturão de quadril entrou, e conseqüentemente os turbantes  começaram a se tornar maiores. Nós realmente precisávamos de mais material para prender nossas quantidades sempre crescentes de jóias, algo com uma base segura. Assim, o turbante  evoluíu de forma pragmática. As tatuagens faciais não foram minha idéia; alguém pensou nisto. Alguém trouxe bindis (ornamento de testa indiano). Sempre que alguém descobria algo novo que elas gostavam, nós todas queríamos. Então chegou ao ponto onde uma pessoa ia comprar alguma coisa, e trazia o bastante para todas. Tornou-se uma diversão, um tipo divertido de complemento. Os figurinos costumavam ser menos uniformes do que eles são agora. Nós tentamos sutiãs com coletes, eu tentei várias túnicas. Era uma espécie de "sobrevivência das mais fortes". As túnicas começaram a rasgar, os coletes eram muito reveladores ou então cobriam o formato do corpo demais. Se os turbantes eram muito altos  , você não poderia equilibrar uma espada. Então de tentativa e erro nosso figurino evoluiu.

Como seu figurino afeta seus movimentos ou estilo de dança? Uma coisa é que nós não podemos usar véu porque não podemos puxá-los por cima dos turbantes ! Também nós não podemos fazer qualquer rotação no chão com eles. Nós podemos, e fazemos, cambrés tanto de pé quanto ao chão; mas não podemos nos curvar para frente ou eles soltarão. Nós podemos fazer emprego de espada se nós tivermos certeza que nossos turbantes  estão corretamente sobre a cabeça. Eu tenho grande admiração por aquelas dançarinas que são capazes de dançar com espadas de cabeça descoberta. Eu nunca poderia fazer isso!Nossos turbantes também tendem a manter-nos muito eretas. Nós tendemos a usar um monte de braceletes e anéis, e tivemos problemas em danças onde gostaríamos de unir os braços ou as mãos porque prendíamos um traje no outro ou apenas não conseguíriamos o que nós tentávamos. Assim, tendemos a não chegar muito perto uma da outra. Às vezes temos que prender nossos pompons em baixo de nossos cinturões se houver muitas pessoas girando próximas  porque elas se enrolarão. Também ajustamos nosso visual atual porque satisfaz todas as dançarinas assim como os movimentos. Tal como com os cholis, que cobrem a parte superior do braço de modo que não precisamos nos preocupar com aquele shimmy (tremido) involuntário do tríceps e podemos estar confiantes que não estará muito visível. Nunca tiramos nossos snujs, e nossos movimentos de mão ficam longe do corpo.



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Uma entrevista com Carolena Nericcio

Tradutora: Suzana Guerra | Revisão: Aline Oliveira | Edição: Ana Harff


Visite e curta: Nossa Tribo & Nossa Dança


sexta-feira, 7 de agosto de 2015

KAJIRA ENTREVISTA CAROLENA NERICCIO - PARTE 2

"A IGNORÂNCIA É UMA VIRTUDE"

Uma entrevista com Carolena Nericcio, Instrutora e Diretora da FatChanceBellyDance de São Francisco. Entrevista conduzida por Kajira Djoumahna, em 06/01/96. 











Como você criou o termo "Estilo Tribal Americano"? Eu o criei? Eu poderia tê-lo maquiado para se safar da "polícia étnica" que está sempre no meu caminho! Então, se eu fui  a pessoa que acrescentou isto, pode ter sido para esclarecer que não estamos tentando imitar uma tribo específica, somos com certeza pessoas Americanas que apreciam esta forma de dança, e não estamos afirmando ser autênticas. Na verdade, alguém pode ter me dito: "Você faz Estilo Tribal Americano", e eu provavelmente disse: "Sim!"

Quantos membros existem atualmente na FatChanceBellyDance? 
Dez, incluindo eu mesma. (Membros além de Carolena são: Suzanne Elliot, Jill Parker, Rina Rall, Suzanne Dante, Kerensa DeMars, Karen Gehrman, Melinda Lee, Pamela Nickerson & Kathy Stahlman.)

Os membros da trupe são amigas próximas assim como companheiras de trupe? Eu acho que nós costumávamos ser muito mais próximas, mas nós esgotamos! O grupo central e eu estamos juntos por muito tempo - 6 anos - e eu acredito que nós somos com certeza velhas amigas. Os membros mais recentes estão apreciando o companheirismo do grupo, mas em geral, não são tão próximas  quanto costumava ser. Eu encorajo todas a se darem bem e conhecerem umas às outras. Isso realmente ajuda quando você está dançandoe  sabe que alguém teve um dia ruim, então você sabe que não deve jogar nada que a atrapalhe, ou se alguém está se sentindo muito poderosa, você pode jogar-lhe muita da responsabilidade extra.

Eu reparei que a FCBD está usando um pouco de coreografia agora. Alguns anos atrás vocês se afastariam  da idéia . Como você decidiu incluir a coreografia em seu repertório? 
Nós dividimos definitivamente nossos espetáculos em duas coisas, uma delas, coreografias, a outra, a improvisação. No começo, nós não sabíamos como fazer a coreografia. Nós não tínhamos desenvolvido o bastante de um formato para todas fazerem a mesma coisa. Levou vários anos de improvisação e conhecimento dos nossos movimentos próprios   até que pudéssemos considerá-la. Então agora, quando nós dançamos nos cafés, que são muitas vezes formatos estranhos e pequenos que você realmente não pode contar , porque as mesas são movimentadas, ou os garçons estão passando por elas com a comida, nós apenas fazemos improvisação. Você realmente não pode fazer coreografias ,por isso! Você estaria uma bagunça - com medo de que se você escapou de esbarrar, você não poderá escapar de novo. Mas se estamos fazendo algo em um grande palco, no Festival de Dança Étnica, ou um dos grandes festivais de dança do ventre, ou nosso espetáculo no Teatro Artaud, nós decidimos que não podíamos apenas sair improvisando! Sabíamos que precisávamos de uma estrutura real. Foi difícil para nós, nenhuma de nós realmente queria fazer isso, porque significava contagem e estar preocupada e não perder um sinal... nós perdemos a paciência várias vezes! Eu tenho vídeos com alguns erros realmente incríveis... Mas foram os dois ambientes, o palco e o café, que nos impulsionaram nas coreografias e   na improvisação . Conosco , nossas coreografias são baseadas em nosso estilo de improvisação. Eu não sei se isso é verdade com outras formas ou estilos de dança. Eu suspeito que o contrário seja verdadeiro muitas vezes . A maneira que nós fazemos a nossa coreografia é baseada no que fazíamos quando estávamos fazendo improvisação; as linhas de visão ainda são as mesmas, os ângulos são ainda os mesmos. A apresentação é uma espécie de improvisação formal.

A FCBD também usou ritmos além de 4/4 recentemente. Como isso aconteceu? Você poderia provavelmente entitular este artigo "A ignorância é uma virtude"! Nós não entramos nesta cena toda da dança do ventre com um plano! Esse lance todo de popularidade foi uma surpresa agradável. Masha nunca ensinou nada senão 4/4. Eu não tinha nenhuma idéia do que fazer com um 9/8 - o que você faria com essas três batidas no final? Então quando nós (FCBD) encontramos um par de melodias que gostamos que vieram a ser 6/8s, só começamos a dançá-las como se fosse um 4/4. Eu tenho que creditar SusuPampanin por bater na minha cabeça e me dizer que eu estava viajando! Eu realmente fiquei irritada com ela no começo, e disse a ela: "Não me diga o que fazer! Eu sou uma artista - Eu posso fazer tudo que eu quero!". Mas então eu realmente olhei a natureza de um 6/8, versus a natureza de um 4/4, e percebi que ela estava certa. Mas nós não sabíamos passo algum para 6s. Então eu decidi que alguns dos nossos passos de 4/4 poderiam ser divididos em dois, e então utilizados em 6/8s. O padrões do toque de snujs foram ajustados de acordo também. Então agora nós podemos usar 2/4, 4/4, 4/8 e 6/8s... mas não me peça para tentar um 9 ou um 12! Eu me desprendi da necessidade de tentar fazer  de tudo – dando certo ou não. Nós apenas fazemos o que é apropriado para nós, e todas as outras podem fazer todo o resto tudo o mais!

Você tinha, ou você fazia, estudo de alguma outra forma de dança? Eu estudei pouquíssimo sobre Kathak (tipo de dança indiana) e um pouco de Flamenco. Eu estudaria mais se houvesse tempo mas não há para mim. Eu incentivo as meninas a estudar essas formas também, e elas realmente amam o Flamenco. Muito embora eu não ache que elas tenham pegado a dança Indiana.

Kathak e Flamenco são influências estilísticas para a FCBD? 
Com certeza. É esse lance todo de Trilha Cigana. Eu não vejo como qualquer uma de nós poderia evitá-la! Nós todas temos essas influências, quer saibamos disso ou não. (como dançarinas do ventre). Eu acho que as dançarinas de Flamenco têm alguma influência de dança do ventre, é recíproco. Mas eu não acho que as dançarinas Indianas Orientais tenham também influência; este estilo é antigo e portanto muito disciplinado. Eu não acho que ele recebeu influência.

A FCBD ainda usa música ao vivo? Eu prefiro não usar. Eu tentei, eu realmente dei o meu melhor. Mas é muito difícil conseguir músicos que mantenham o tipo de ritmo que nós queremos e não os  deixe entediadas. Nós realmente precisamos de muita repetição. Eu acho que as pessoas não percebem é que a música de dança Oriental e a música de dança folclórica são duas coisas diferentes. Nós com certeza precisamos da folclórica. Não há um monte de bandas folclóricas. Sirocco é apenas a única que eu encontrei que realmente pode estabelecer esta base de tabl beledi (tambor dupla face tocado com varas) e mizmar (instrumento de sopro semelhante a uma corneta) poderosa, e  permanece nela até que eu os sinalize para mudar.

Como você chegou ao nome, FatChanceBellyDance? 
Eu não queria um nome para a minha trupe de dança que fosse tão difícil de pronunciar quanto meu sobrenome ! Eu não sentia qualquer ligação com nomes Árabes porque eu não sou Árabe. Há aquela história sobre quando eu era jovem e boba, diria aos homens que eu era uma dançarina do ventre e eles pediriam por um espetáculo privado. Eu pensaria "Fat Chance! (sem chance) " . Eu contei ao meu amigo Jim (Murdoch), que é um palhaço, com um senso bastante sutil mas constante de humor, e ele apenas disse: "Oh, Fat Chance Belly Dance!" Eu só sabia que queria isso! O primeiro grupo de dançarinas odiaram totalmente o nome. Elas não podiam acreditar que eu tinha escolhido um tal apelido deselegante pavoroso para descrevê-las. Mas eu sabia o que estava fazendo, eu escolhi uma frase Americana para uma trupe de Estilo Tribal Americano que era simples e cativante a qual ninguém seria capaz de esquecer. A seu mérito, ninguém se esqueceu ainda!

Há quanto tempo você ensina? 
Desde 1987.

Você tem as maiores turmas, mais aulas por semana que qualquer professora de dança do ventre que eu já vi. Em sua opinião, quantas alunas cursam suas aulas a cada semana? 
Cerca de cinqüenta.

O quê, você acredita, a o torna uma das professoras mais populares na Área da Baía de SF? 
Consulte o título desta entrevista! (risos)... Bem, no início, havia um grande alvoroço sobre as tatuagens, porque  então, muitas  mais de nós eram tatuadas do que agora. Isso foi apenas um puro golpe de sorte no entanto, porque a maioria de nós já era tatuada antes  mesmo de nos conhecermos. Nós gostávamos disso, nós éramos uns tipos selvagens . Naquela época, muitas das alunas tinham amigas que seriam consideradas "alternativas", e estavam interessadas em aprender dança do ventre, mas não estavam dispostas a ir a uma turma em que suas tatuagens ou piercings, seriam consideradas uma aberração. Então eu acho que no começo, foi tudo boca a boca. As pessoas se sentiam confortáveis. Elas podiam relaxar, eles não esperavam olhar ou serem olhadas de um certo modo. Elas podiam ter qualquer  tipo corporal, ou qualquer estilo de cabelo. Nós tínhamos estilos de cabelo e tipos corporais, tatuagens e piercings de TODOS os tipos! É realmente uma coisa de São Francisco ser visualmente incomum. Acho que as pessoas se sentiram confortáveis de virem às a minhas aulas porque elas não seriam examinadas, elas seriam admiradas. Eu acho que, em geral, as pessoas que cultivam um visual alternativo, tão extrovertido e confiante quanto elas parecem estar com a sua decisão, realmente preferem estar  em torno de pessoas como elas mesmas. Há também a afirmação feminina. Tenho certeza que deve ser verdade para turmas de todo o mundo, de qualquer forma. Eu não posso imaginar que uma sala cheia de mulheres coletivamente se colocaria pra baixo! Eu sei que em minhas turmas, as pessoas definitivamente gostam da energia feminina estabelecida. Não é baseado   no que é bonito  para os homens, é baseado no que é bonito  para nós mesmas, e colaboração com outras mulheres. Estou feliz que elas se sintam  deste jeito. Então, foi assim que começou. Agora as coisas estão mais sob controle . Eu realmente escutei e observei minhas alunas ao longo dos anos. Presto atenção ao que elas querem, e se é algo que eu posso providenciar, eu faço. Sou muito leal, mas a estrutura de aulas também é disciplinada. Acho que as pessoas apreciam esse equilíbrio. Essa é a idéia tribal, se você faz o esforço de vir a aula,   encontrarei você em mais da metade do caminho. Mas, você tem que prestar atenção e respeitar a mim e as alunas mais velhas da turma. Nós, por sua vez, apoiaremos e estimularemos seus esforços. Do ponto de vista físico, eu fui arrebatada pela ciência da cinesiologia. Como o corpo se move. E análise do movimento, o porquê de  nos movermos movemos da maneira que nós nos movemos. Esses estudos acrescentaram profundidade a minhas aulas, tenho certeza.

Você se sustenta (economicamente) unicamente da dança do ventre ? Sim, eu me sustento.



Para ler o original, clique AQUI
Uma entrevista com Carolena Nericcio

Tradutora: Suzana Guerra | Revisão: Aline Oliveira | Edição: Ana Harff


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segunda-feira, 20 de julho de 2015

E O FIGURINO NO ATS?

Chovendo no molhado (ou não, rs), achei legal postar algo novamente sobre o figurino. Fui no Blog ATS e ITS da bailarina e professora Aline Muhana, e achei algumas matérias postadas em 2010, mas sempre atuais. 

"O figurino de ATS já evoluiu bastante nos últimos 20 anos, porém as suas características principais que são a opulência e o caráter étnico nunca foram abandonadas. Basicamente o figurino se compõe de calça, saia (ou saias) cinturão decorado, choli, bustiê de moedas (ou de outro acessório que esteja de acordo com a estética étnica-tribal), turbante ou headpiece. Os acessórios são usados em abundância e profusão: anéis, braceletes, pulseiras, colares, broches, flores, xales e maquiagem étnica (mehandi, desenhos faciais, bindis) e carregada.


As etnias mais utilizadas no caldeirão de influências são a indiana, paquistanesa, egípcia, turca e africa-saariana. Ultimamente acessórios dos povos das Américas, Europa oriental e ásia central também tem sido incorporados. Sem contar é claro a influência cigana e nômade que sempre permeou o estilo.

Historicamente falando não existe qualquer laço de autenticidade entre os componentes no figurino de ATS. Ele surgiu e se desenvolveu graças à influência de pessoas como Masha Archer e Carolena Nericcio, que desenvolveram a idéia inicial de Jamila Salimpour, que por sua vez também inventou a estética do Bal Anat misturando influências e figurinos ao seu gosto pessoal. Carolena cita em entrevista no vídeo San Francisco Beledi: "Por um lado, esteticamente falando, tudo funciona junto, mas por outro lado realmente não há uma origem, porque isso é apenas um apanhado de peças artísticas postas juntas... Tribal é apenas algo que inventamos."

Assim como o próprio ATS sofreu influências dos seus participantes assim também foi com o figurino. O turbante foi uma peça que foi gradualmente substituída pelo headpiece decorado com penteados elaborados e muitas flores. Isso não significa que ele foi esquecido, muitos grupos ainda o utilizam. O choli também sofreu modificações e chegou a ser substituído por túnicas transparentes e casacos ghawaze e até mesmo abolido por alguns grupos. Tudo depende da intenção e do gosto de cada grupo, respeitando a a estética geral do estilo.

CHOLI - Este tipo de blusa é utilizada pelas mulheres indianas e paquistanesas como complemento do sari. É feito tradicionalmente com um pedaço de tecido excedente que vem junto ao sari quando adquirido no comércio. A modelagem é bem ajustada, com mangas curtas e decote raso. 

O choli é considerado elemento base da vestimenta do ATS, assim como as calças bufantes.

BUSTIÊ O Bustiê decorado da dança tribal descende do hábitos dos povos nômades do oriente de carregar consigo os seus pertences mais valiosos durante as suas viagens. O dinheiro era costurado nas roupas para evitar o roubo e para ostentar a riqueza do dote das mulheres. O bustiê de moedas é utilizado na vestimenta tradicional de dança do ventre assim como o indefectível xale de moedas (presente em figurinos de várias danças folclóricas). A peça normalmente é bordada com moedas antigas furadas (ou soldadas com virolas metálicas), botões de latão, retalhos de tecidos nobres e brocados e toda a sorte de elementos metálicos simbólicos (pequenos pingentes, medalhas, correntes, espelhos e berloques) dando um aspecto pesado e opulento.

CALÇAS - Pantalonas, bombachinhas, calça saruel são sinônimo da calça usada pelas dançarinas para ser a base do figurino de ATS. A sua função é resguardar a intimidade da bailarina durante os giros (quando a saia rodada sobe) e fazer referência a culturas milenares que a utilizavam como roupa de baixo. Não existe uma fonte de referência exata da cultura que inspirou o seu uso, afinal a calça bufante é utilizada por diversos povos através do globo, tanto por homens quanto por mulheres e crianças; como roupa de baixo ou como principal. A calça normalmente é feita de algum tecido leve e com um bom caimento, e com cores contrastante à da saia de cima, justamente para criar um "elemento surpresa" nos giros e viradas rápidas, ou como complemento à combinação de cores dos acessórios.
SAIA As saias utilizadas no ATS são extremamente rodadas. O menor diâmetro de baínha usado é a de 9 jardas (aproximadamente 8 metros) e o maior é a de 25 jardas (23 metros). O modelo mais tradicional lembra bastante a saia cigana Boho e é feito em camadas franzidas de tecido leve e natural (não se utiliza tecidos brilhosos ou sintéticos, a estética deve ser tradicional até na textura dos tecidos) e pode ser em cores sólidas ou estampadas. As saias utilizadas na dança cigana e espanhola com grandes florais podem ser usadas assim como as saias indianas de estampa de jaipur (um tipo de tye-dye com pequenos pontos coloridos amarrados um a um manualmente)ou as de petit-pois. Outras saias como as coloridas banjaras indianas podem ser usadas apesar de serem mais justas, porém normalmente estas são transformadas para serem usadas como "capas" das grandes saias franzidas.


CINTURÃO Os cinturões tanto na dança tribal como na dança do ventre tem uma função inicial básica: dar destaque aos movimentos do quadril. No ATS não poderia ser diferente, os cinturões normalmente são largos, coloridos, brilhosos e ricamente decorados. Faixas bordadas com espelhos, missangas e moedas importadas das índia ou paquistão são bastante populares. Estas faixas são bases para montagens com pompons de lã, correntes franjas e painéis texteis. Para arrematar, xales coloridos e bordados completam o visual. Os cinturões podem ser substituídos por xales de moedas egípcios, cordas de mozunas, ou cintos de couro com aplicações de metais. O que vale é destacar a linha do quadril e sobrepor de maneira elegante as diferentes peças étnicas." (Aline Muhana)


FONTES